terça-feira, 26 de outubro de 2010

Heresias no zen


Ora , há que considerar que ninguém pode dizer que está falando em nome da posição mahayana em geral, afinal o mahayana é bastante amplo e abrange muitos escolas. Que o movimento mahayana históricamente parece surgir alguns séculos após o surgimento inicial do budismo é coisa largamente documentada.
Que na Índia nunca chegou a atingir posição predominante também, na época da quase completa erradicação do budismo no sec 13 os visitantes declaram que os mahayana eram minoritários na Índia.
O mahayanismo além de fortemente crítico para com as escolas antigas, as quais depreciativamente chamou de hinayana, também passou a produzir vasta cópia de escrituras que atribuiu ao Buda histórico e que leêm suas escolas, entre as quais a minha, a Soto Zen, cujos mais prestigiados sutras são o Lankavatara, o Surangama e os Prajna Paramitta, algumas escolas passaram a declarar que estes ensinamentos foram dados pelo próprio Buda histórico, apenas ficaram escondidos ou secretos porque não eram para todos os alunos devido a sua capacidade. Assim o mahayanismo adquiria uma legitimidade e uma superioridade declaradas. ( que alguém fique revoltado com esta análise fria será produto apenas de seu desejo de proteger uma crença, e também o de que todos devem partilhar de um ponto de vista único) Outras escolas, para que pudessem produzir novos textos e aprofundamentos aceitavam o que seus grandes mestres escreviam dando a estes o título de sutras (caso de Hui Neng no zen) como se o Dharma continuamente se manifestasse e se ampliasse (bonita proposição) e assim aceitando como legítimos estes sutras claramente séculos posteriores ao Cannon do Terceiro Concílio, e ainda outras escolas declaravam (e o tem como artigo de fé) que textos originais, por séculos escondidos ou ocultos, eram descobertos e revelados por mestres, mas que eram originários do próprio Buda original.
Evidentemente, se usamos uma leitura mística, quaisquer destas alegações pode ser adotada, porém o simples entendimento de que o budismo pode ser uma obra coletiva e de transmissão também simplifica as coisas sem que seja necessário dizer que o mahayana não aceita ser classificado como desenvolvimento, esta é uma interpretação, mas existem outras, e como monge de uma escola mahayana prefiro a postura menos mística e o entendimento de que estamos construindo o budismo a cada momento, por isto surgem escolas novas e mestres que ensinam com métodos adaptados a novas situações, que bom que é assim.
É claro, quando se fala assim, logo surgem acusações de heresia, mas no zen isto é até bem visto, o próprio zen, se tivesse surgido no ocidente, seria uma clara heresia...

(Resposta de Monge Genshô em discussão aberta, em lista budista, em 2005)