quarta-feira, 6 de junho de 2012

Acordar do sonho



“...liberta-se instantaneamente dos sofrimentos que surgem da (ignorância da lei da) mudança incessante do nascimento-e-da-morte. Se um Buddha pudesse evitar, você pensa que ele permitiria que um único ser sensível caísse no inferno?. Sem a Auto-percepção não se pode compreender coisas como estas.”(Texto)
Aqui há três ensinamentos importantes. Primeiro se nós compreendermos que nossa mente é Buddha, é como virar uma chave e isso é que faz a Escola Zen ser conhecida como uma escola instantaneísta, em um único instante você pode despertar, pode se iluminar. Num único momento levando a crise bem longe, nós podemos, repentinamente, acordar do pesadelo. E este acordar-se é a própria iluminação. È enxergar a sua mente Buddha que na realidade não é nada do que foi construído em volta, mas a verdadeira natureza que não depende de nascimento e morte. 
A base de tudo, a vacuidade do qual tudo o que nós vemos é fenômeno. Não é na realidade sólido e verdadeiro. Uma das escolas buddhistas, a Escola Yogachara, levou bem longe essa análise dizendo que qualquer coisa surge e desaparece instantaneamente, que é por causa de uma plêiade de condições que esse copo aqui na minha mão surge, mas um infinitésimo de tempo depois que ele surge ele desapareceria se estas causas e condições não estivessem presentes para faze-lo surgir de novo, então na verdade o surgimento de todas as coisas é uma sucessão de infinitésimos de manifestações. 
 Todas as coisas são sustentadas por uma rede de conexões, de causas e condições que fazem com que surjam. Se essas causas e condições cessassem, instantaneamente as coisas desapareceriam. É como este sol entrando aqui na sala. Se a estrela sol desaparecesse, instantaneamente a luz que nós vemos desapareceria porque teria sumido a condição que sustenta esta manifestação da luz. Na verdade se isso acontecesse, antes que alguém diga, levaria oito minutos para nós percebermos, que é o tempo que a luz leva para chegar do sol até aqui, mas não importa no nosso exemplo. Todas as coisas são sustentadas por condições e nós também e todas as coisas que nós olhamos. Então essas coisas são ilusórias nesse sentido. Não é que elas não existam, mas elas são apenas manifestações, aparências.
 E isso é o que acontece conosco também, nós todos somos meras manifestações. E tudo o que nós estamos vendo também é mera manifestação. Há  algo sólido atrás de tudo isso, mas essas manifestações só se sustentam porque as causas e condições que as fazem surgir permanecem. Isso faz com que tudo o que nós vemos seja automaticamente impermanente. Todos os universos existentes são impermanentes. Na tradicional cosmologia Buddhista, que não importa se correta ou não, sempre se admitiu a existência de muitos e muitos universos cíclicos que surgem e desaparecem, porque esta é a natureza das manifestações. Surgir e desaparecer. Mesmo que dure bilhões de anos uma manifestação ela um dia esgota a sua energia  e desaparece, e isso deve acontecer também com o nosso universo. 

Então, existe alguma chance de nós permanecermos com a nossa espécie ou o nosso mundo? Não, nenhuma chance de permanecer para sempre. Nem o nosso universo inteiro pode permanecer para sempre. O que pode permanecer para sempre? Só a vacuidade. Por isso essa vacuidade não é o nada porque ela é aquilo do qual tudo surge o que é bastante diferente de um nada. Segundo, compreendendo que sua mente é Buddha libertamo-nos instantaneamente dos sofrimentos que surgem, da ignorância da lei da mudança incessante. Por quê? Porque se nós percebermos esta eternidade a qual pertencemos, cessa o sofrimento que provém da impermanência. Mas não basta nós entendermos isso com a nossa lógica. Não basta estudar física como as pessoas fazem hoje e dizem: a física moderna diz isto, isto não faz o sofrimento cessar. A única maneira de fazer o sofrimento cessar é sentar em zazen e enxergar a mente claramente e assim ter clareza, e essa clareza iluminando tudo faz com que nós percamos o sofrimento que provém de vermos as manifestações temporárias e nos apegarmos a ela.
Por isso sofremos em relação aos filhos, por exemplo, porque é temporário o tempo de vida deles, um dia nós os deixaremos ou eles nos deixarão. Esperemos que nós os deixemos. Um dia eles saem de casa, eles mudam e deixam de ser crianças adoráveis para serem adolescentes complicados, depois deixam de ser adolescentes complicados e um dia, voltam como adultos amorosos, então não existe estabilidade, nem sequer nesses seres que nós amamos tanto, com quem temos essa ligação genética, de sangue. Outro é que se Buddha pudesse evitar ele permitiria que um único ser sensível caísse no inferno ou seja, sofresse? A resposta é que Buddha não tem esse poder, ele é um mestre só, se tivesse ele eliminaria o sofrimento.
Ele apenas tentou dar a solução do sofrimento. A escapatória do inferno e do sofrimento é esta compreensão clara, mas não a compreensão do intelecto, e sim a compreensão afetiva, uma compreensão integral que só pode ser conseguida através do despertar da própria mente. E terceiro, sem a auto percepção não se pode compreender coisas como estas, ou seja, nenhuma solução que possa vir de fora, não pode vir de Buddha, não pode vir de nenhuma divindade, de ninguém pode vir a solução para o despertar. A solução para o despertar só é alcançável pela investigação de nossa própria mente. Nós é que temos que acordar do sonho e por isso o treinamento tem que ser tão duro. Porque o nosso mergulho na ilusão é forte demais, é extremamente poderoso. Nós como manifestações nesse mundo movidos por essas energias kármicas ficamos assim profundamente deludidos.