terça-feira, 27 de novembro de 2012

A mente compassiva



Pergunta – (...) O que é a compaixão?

Monge Genshô – A compaixão depende do esquecimento de nosso próprio ego. As pessoas têm um eu que, normalmente, nas mais primitivas pessoas, termina na sua pele. Tais pessoas cospem e jogam lixo no chão porque não enxergam que o mundo vai além de sua pele. Há pessoas cujo “eu” termina na superfície da tinta de seu automóvel, então jogam latas pelas janelas do carro, porque fora do automóvel já não é mais seu mundo. Podemos ver de que tamanho é o mundo de alguém. Se o mundo vai até a pele, até o carro, aos limites de sua casa. Nunca me esqueço do dia em que vi uma mulher na Alemanha varrendo a rua na frente de sua casa, porque há pessoas que varrem  além de sua casa. Neste caso, esse “eu” estava mais ampliado. Outros pensam que o mundo tem fronteiras, às vezes é sua raça, seu time de futebol ou a fronteira de seu país e os que estão além dessas fronteiras podem ser considerados inimigos. Outros, ainda, pensam assim em relação a sua religião. 

Tudo depende de como é seu ego. A compaixão surge à medida que você amplia os limites de si mesmo, se estendendo para chegar a abranger todo o universo. Se abranger todos os seres humanos, todos os animais, todos seres vegetais, será difícil quebrar uma pedra, porque não matar, como preceito, inclui não quebrar uma pedra quando não há necessidade, não destruir nada. Porque o mundo mental é mais amplo, a compaixão se expande. O crescimento da compaixão então compreende esquecer-se de si mesmo, o que significa morrer para si mesmo. Assim fazendo, podemos, então, abarcar tudo, e ao acontecer isso, existe a libertação, porque quando nós manifestamos a ignorância de nos acreditarmos separados de tudo - e os venenos da mente como o apego, a aversão, a raiva, enfim, todos eles dependem de eu acreditar em mim mesmo como ser separado – não temos compaixão. 

Esta é a ignorância fundamental, a de acreditar que somos um “eu” separado. Porque acreditamos que somos um ser separado de todos os outros, não temos compaixão. Quando morremos para nós mesmos, nasce um ser muito mais amplo e esse ser é naturalmente compassivo, porque a dor do outro dói nele. Na realidade, essa idéia – e isso nos mostra abrangência do Dharma – ela existe nos escritos de Paulo nos evangelhos, “Não sou mais eu quem vive, mas Cristo que vive em mim”. Isso significa morte do “eu”. Também encontramos o Dharma nos poemas de São João da Cruz, “Morro porque não morro”. Ou seja, morro porque não consigo morrer para mim, e por isso eu não consigo conhecer Deus. Em termos budistas, porque não consigo morrer para mim mesmo, não me ilumino. É a mesma coisa, em outras palavras.