quinta-feira, 31 de janeiro de 2013

De que tudo está vazio?



Mesmo assim essa unidade não diz, eu sou a unidade. A unidade é vazia completamente de um eu, por isso o conceito de vazio torna-se tão importante no budismo. Porque, de que as coisas estão vazias? As coisas, todos os fenômenos, nós, somos vazios de um eu. Porque não existe eu algum, então, o vazio são esses próprios fenômenos. Se o vazio são os fenômenos, então os fenômenos são o próprio vazio. Por isso vocês todos são a vacuidade e a vacuidade somos todos nós e a miríade de todas as coisas. Por isso é necessário esquecer-se de si mesmo para ser iluminado pela miríade de todas as coisas. Essa é a essência do ensinamento budista.

Pergunta – Digamos que a mente passou pelo estágio da virtude e chegou ao estágio da compaixão. Ainda há o terceiro estágio que seria o da vacuidade. O que é necessário para passar do estágio da virtude para o estágio da compaixão?

Monge Gensho – A virtude são simples regras, como se alguém dissesse a você, “Não faça isso, pois isso causa sofrimento”, isso é o preceito, a virtude. Para passar para a compaixão é necessário um eu menor e sentir o que os outros sentem. A compaixão é perceber o que acontece com os outros seres no universo. Isso é compadecer-se. Trata-se de uma ampliação da consciência. Já o terceiro estágio da não dualidade é muito difícil, nada fácil de ser ensinado ou percebido, o estágio da não dualidade implica numa realização espiritual muito mais profunda, por isso que o sutra do coração é difícil de ser entendido. Porque ele trata essencialmente da não dualidade. Lembrem-se, o sutra do coração diz, “O vazio é forma e forma é vazio”, isso é a essência do que eu disse por ultimo.

quarta-feira, 30 de janeiro de 2013

A mente compassiva



A terceira parte do voto diz, “siga o caminho de Buda”. O caminho de Buda é um caminho de investigação sobre como evitar o sofrimento. Buda abandona sua vida deliciosa e cheia de prazeres, vai para a floresta para meditar, jejua, pratica o mais severo dos ascetismos, maltrata seu corpo durante anos, procurando o bem. Descobre que o bem que ele buscava alcançar daquela forma, era o mal, pois ele tinha ficado tão fraco que não tinha mais energia.

Assim que ele aceita arroz com leite de uma moça chamada Sujata, senta-se para meditar e seus colegas de ascetismo o desprezam e o abandonam porque ele passou a comer. Buda desenha então o caminho do meio, nenhum extremo é realmente bom, temos que procurar uma conciliação entre os extremos, porque é muito difícil definir onde está o bem e onde está o mal, o caminho de Buda é chamado então MADHYAMIKA, o caminho do meio. Os preceitos falam sobre virtudes, com seus “não matar, não roubar, não usar drogas ou substancias que alterem a consciência, não causar sofrimentos aos outros com sua sexualidade”.

O caminho da virtude é comum a praticamente todos os caminhos espirituais, mas ele é apenas o primeiro e tende facilmente a construir pessoas que se agarram a regras ou ao fundamento, por isso, logo em seguida vem o segundo passo que é o caminho da compaixão. Isso é a ênfase do budismo Mahayana, do qual em grande parte o Zen descende. O caminho da compaixão significa, primeiro olhe compassivamente, porque pode ser que uma regra pura não seja o bem. Podemos pegar como exemplo o primeiro preceito, “Não matar”, mas se você estiver numa situação que matar um homem salvaria a vida de quinhentos homens? Que decisão você tomaria? Então, o budismo não pode lhe dar respostas fechadas do tipo, a regra pura pode ser seguida e ser inevitavelmente o bem, porque isso pode não acontecer.

Em terceiro lugar existe outro passo muito importante. Primeiro a virtude com suas regras e seu problema de criar fundamentalismo ou uma cegueira com relação ao sofrimento. Em segundo lugar o sentimento compassivo, uma mente compassiva, uma mente compassiva na realidade não precisa das regras daquela forma, com uma mente compassiva você não precisa dizer, “Existe uma regra não matar”, por que alguém que é compassivo vai matar pelo prazer de matar? Por que ele destruirá? Uma mente compassiva vê beleza e protege a vida naturalmente. Porem, a mente compassiva, que é a mente do bodhisatva, ainda tem dentro de si um paradoxo, ainda tem dentro de si um eu e tem dualidade. Porque existe o outro e ele tem compassividade pelo outro, ele ainda não tem uma mente completamente iluminada. Chama-se isto de iluminação com resíduos. O pensamento de compaixão ainda é um pensamento onde existe o “eu estou aqui e eles estão lá”. O sentimento de compaixão é um sentimento que tem dentro de si naturalmente a dualidade. Então quando surge o fim da dualidade em que o eu se dissolve, não existe mais o caminho da virtude nem o caminho da compaixão, porque a não dualidade implica que não existe o eu e o outro, a dor dos outros é a minha dor. O sentimento de compaixão desaparece dentro de uma concepção de perfeita unidade.

terça-feira, 29 de janeiro de 2013

O bem e o mal, o que é ser bom ou ser mau?



Os preceitos budistas, que são tomados no jukai, (cerimônia dos votos em que os praticantes recebem o rakussu), parecem cheios de nãos e tem a marca da virtude, característica do primeiro passo do caminho espiritual. Uma parte deles, que resume tudo, diz, “fazer o bem, evitar o mal e seguir o caminho de Buda”.

Vamos explorar essas três pequenas frases. O que seria o bem? Onde está o bem? O que seria o mal? E onde está o mal? Se nós penetrarmos profundamente nessa questão ficaremos confusos, porque aquilo que a uns parece o bem a outros parece o mal, e algumas pessoas crêem que ao fazer o mal, estariam praticando o bem. Crêem por exemplo que, um extermínio poderia ser bom, ou crêem que se fizerem determinada coisa ela irá gerar um bem automático, e muitas vezes quando pensam que estão fazendo o bem podem criar uma tragédia. Afinal o que é ser bom, o que é ser mau?

Na antiga União Soviética havia um grande lago. Esse lago, ao qual chegavam alguns rios importantes, chamava-se Mar de Aral. Mar com peixes, pesqueiros e cidades à beira, tão grande que tinha o nome de mar. Um projeto governamental resolveu irrigar terras com os rios que chegavam ao mar de Aral. O mar tornou-se salgado através de milhões de anos, porque a água que ali chegava tinha pequena quantidade de sal, mas com a evaporação o sal ia se concentrando, dessa forma transformou-se num mar como qualquer dos mares. Os projetos de irrigação foram criados para produção de grande quantidade de algodão e outras plantas, foi bem sucedido e começou-se logo a colher. Mas o Mar de Aral não recebia mais a água dos rios e começou a encolher, descer. As cidades a beira do Mar de Aral, que tinham barcos pesqueiros, perderam seus portos e a medida que o Mar recuava através dos anos, foi deixando atrás de si uma terra coberta de sal. O sol secou o sal, tempestades de vento começaram a espalha-lo nas plantações e um enorme desastre ecológico aconteceu na região em volta do Mar do Aral, porque algumas pessoas pensaram que fariam o bem. Hoje, foram desbloqueadas as barreiras para que parte dos rios voltem ao Mar de Aral, dessa forma, uma parte voltou a ter água. Está se tentando reverter o que se fez no passado.

Nosso país todo é um exemplo disso também, da mata Atlântica sobre talvez sete por cento. Com o objetivo de uso da madeira, criar plantações e pastos, a mata foi aos poucos sendo devastada. E todo o tempo parecia que isso era o bem. Podemos listar infinitas histórias parecidas nas nossas próprias vidas. Então quando o preceito diz, “Faça o bem”, devemos perguntar, “Exatamente o que é o bem?”. O bem seria não produzir sofrimento a longo prazo e estimando todas as conseqüências? Temos que compreender que é muito difícil definir o que é o bem. O mal também tem muitos aspectos. Há uma história budista que diz; - um jacaré come um pato numa lagoa, onde está o bem e onde está o mal? Para o pato uma tragédia, para o jacaré foi uma refeição, decida você onde está o bem e onde está o mal.

(continua)

segunda-feira, 28 de janeiro de 2013

Palavras no início do zazen




Sentamos em zazen para enxergarmos nossa verdadeira natureza. Nossa verdadeira natureza está além dessa existência, além desse ser que nasce e morre, nossa verdadeira natureza é compartilhada com os pássaros lá fora, com toda a vida da terra, com nossos ancestrais, com nossos descendentes. Somos muito mais do que esse fenômeno que nasceu e que irá morrer. Sentamos em zazen e não cogitamos mais passado e futuro. Não lutem com seus pensamentos, não raciocinem, não sigam idéias, apenas sentem nesse momento, ouçam os pássaros, o ruído do trafego e nossa própria respiração. Esse momento é a única realidade e se ficarmos nele adquiriremos paz. Essa paz nos permitirá enxergar mais profundamente e alcançarmos a verdadeira sabedoria. Não se trata de acreditar, mas sim de experimentar. Então, experimentem, fiquem aqui, não se deixem levar pelos seus pensamentos, retornem para cá a cada momento. Sejam senhores de suas mentes. 


(Palavras de Monge Genshô no início do zazen, gravadas e decupadas por Chudô San)

sexta-feira, 25 de janeiro de 2013

Busquem a libertação



Aluno - No caso do terrorista se a pessoa vai lá e simplesmente o mata para salvar as pessoas, gera um tipo de carma. Agora se ele o mata com ódio no coração, o carma gerado é diferente?

Monge Genshô – Você teria que agir com a compaixão de impedir que ele fique com o carma de matar quinhentas pessoas, matá-lo por ele também, com a intenção de salvá-lo. Isso é freqüente, claro, neste exemplo radical estamos em uma situação limite, mas isso é muito freqüente na vida. Eu sou pai, tenho um filho. É certo ou errado dar um grito com uma criança? Depende, as vezes pode ser muito bom dar uma bronca tremenda, quando ela for a maneira correta para você impedir que uma coisa mais grave venha a acontecer. Você tem que fazer aquilo, tem que fazer com a energia certa para obter determinado resultado. Não fazer dessa forma, aí sim seria o errado.

Dogen prossegue: - "Esses são então, os oito aspectos da iluminação, cada um deles contem os outros oito, logo, são sessenta e quatro. Falando de forma mais ampla se você os desdobrar eles se tornam infinitos, se os resumir são sessenta e quatro. Esse foi o último ensinamento do nosso Mestre Buda Shakyamuni, a essência do Mahayana, pronunciado por volta da meia noite do dia quinze de fevereiro. Daí em diante ele permaneceu em silêncio até sua morte. Buda disse concluindo, “Praticantes, sempre busquem com todo o coração o caminho da libertação, já que todas as coisas do mundo, móveis e imóveis, são formas instáveis sujeitas a morte, parem agora e não falem mais, o tempo esta acabando e vou atravessar para a extinção, esse é meu ultimo ensinamento”. "Portanto, discípulos de Buda definitivamente devem estudar esses princípios. Aqueles que não estudam ou praticam esses ensinamentos não são discípulos de Buda. Esses ensinamentos são o tesouro do olho do Dharma verdadeiro, o coração do nirvana. Apesar disso, entretanto, existem muito que ignoram esses ensinamentos e poucos que são conscientes deles. Aqueles que não entraram em contato com esse ensinamentos, estão nessa situação devido a más influências e também devido a falta de ações virtuosas no passado. Antigamente nos períodos do verdadeiro dharma e da imitação do dharma, todos os budistas conheciam e praticavam estes oito aspectos, hoje em dia é difícil encontrar um ou dois entre mil monges que conheçam esses ensinamentos. "

 Ele está falando em 1253 DC e considera que a prática está horrível: - " Que pena, a decadência dessa nossa era degenerada é mesmo inimaginável. Devemos nos apressar para aprender e praticar esses ensinamentos já que ainda é possível encontrá-los, não sejam negligentes. É difícil encontrar os ensinamentos de Buda mesmo em incontáveis eras, é igualmente difícil nascer como ser humano. Nós, não só tivemos a sorte de nascer como seres humanos, como também a sorte de nascer em um local onde é possível ouvir os ensinamentos do Buda. Aqueles que morreram antes de Buda também não ouviram esses ensinamentos. Graças ao poder de nossas ações virtuosas no passado, entretanto, nós podemos ouvi-los e estudá-los. Agora, devemos estudar e desenvolver estes oito aspectos vida após vida e assim, certamente alcançaremos a insuperável iluminação. Se além disso, nós o expusermos à todos os seres ser cientes, então nós mesmos não seremos diferentes do Buda Shakyamuni. "

Pergunta - O senhor poderia lembrar o primeiro? Ou todos...

Monge Genshô – Ter poucos desejos, satisfação, apreciar a quietude, diligência, plena atenção, meditação, sabedoria e abster-se de uma mente discriminativa.

quinta-feira, 24 de janeiro de 2013

Certo e errado



Pergunta – Falando de forma genérica, algo no meu trabalho, algo acontece que eu não goste, não posso lutar para mudar? Não falando de apego, mas algo que eu não goste.

Monge Genshô - Com certeza. Você deve, porque você está agindo no mundo para fazer alguma coisa melhor . O que deve ser examinado são suas motivações. “Quero mudar isso porque não gosto, eles gostam disso e eu não, então vou impor aos outros meu gosto”. Nesse sentido é mente discriminadora. Não é o caso de, por exemplo, vamos melhorar essas janelas, vamos colocar telas para que os mosquitos não entrem. Essa é uma mudança boa que todos concordariam. Porem, se temos uma pessoa na sala que diga, ”mas eu não gosto de tela, as telas deixam a janela feia”, isso seria sua mente discriminativa funcionando. Preste atenção nas conversas normais e veja quantas vezes as pessoas dizem “gosto”, “não gosto”, ”detesto”, “prefiro”, quantas vezes isso é manifestado. O que devemos é nos examinar, prefiro por que? É bom para o grupo? Bom para o funcionamento do mundo? Ou por acaso é uma simples manifestação minha, de meu ego? Em geral no budismo não existem declarações de certo e errado. Mesmo as coisas mais clássicas, por exemplo, “não matar”, o primeiro preceito, sempre, em todas as circunstancias será errado matar? Não. Haverá circunstâncias em que isso pode ser mudado, exemplo, um terrorista vai matar quinhentas pessoas e você o mata antes. Você, para não descumprir o preceito, deveria deixar que ele matasse quinhentas pessoas? Cada situação é diferente. Não existem no budismo respostas fechadas.

Pergunta – O que se faz no mosteiro com ratos e baratas?

Monge Genshô – Em mosteiros, por princípio, não se mata para comer. Nos casos de baratas, pega-se a barata e leva-se para fora. Você tenta conviver com a situação, não mata mosquito, mas usa repelente. Mas haverão circunstâncias em que as coisas não serão assim. Você tem um prédio de madeira e tem problemas com cupins, não se pode perder o prédio. Mas não existe ato cometido, mesmo benéfico, que não tenha carma envolvido. O exemplo do terrorista, existe carma nesse ato? Existe. De qualquer forma você fez, você assumiu. Existe grande benefício em favor de outras pessoas, mas gera carma, este pode ser bom ou ruim, ou as duas coisas ao mesmo tempo. Cada problema ético vocês tem que resolver a luz do bom senso e o budismo não dirá à vocês certo é isso e errado é aquilo. É aquele tipo de questão que se você pergunta para um mestre budista ele não resolve para você, no máximo lhe ajuda a pensar.

quarta-feira, 23 de janeiro de 2013

Conversas vãs


"Oito, abster-se das conversas vãs. Abster-se das conversas vãs significa desapegar-se da discriminação arbitrária. Quando nós compreendemos a realidade plenamente, nós não mais nos envolvemos em conversas fúteis. Buda disse, “Praticantes, se vocês se entregarem a diversos tipos de conversas fúteis, sua mente será perturbada. Daí, mesmo se vocês se tornarem monges não alcançarão a iluminação, por isso vocês devem imediatamente abandonar esse tipo de conversa. Apenas aqueles que fazem isso podem experimentar a tranqüilidade e a bem aventurança do nirvana”.

O que significa conversa vã? Dogen explica, “desapegar-se da discriminação arbitrária”, descriminação arbitrária é constituída por todas as considerações do tipo “gosto disso” ou “não gosto daquilo”, todo esse tipo de declaração é discriminativa. A mente das pessoas que tem preconceitos raciais, pessoas que dizem, “não gosto de pessoas de tal raça”, isso é um tipo de mente discriminatória arbitrária funcionando. Vejam quantas práticas embutidas a respeito há no sesshin, fazemos tudo juntos, não adianta pensar, “não gosto de fazer prostrações!”, temos horários para fazer prostrações, tem o aspecto da comida, comemos todos juntos, pode comer menos, mas tem que comer. Para que isso? Para treinar uma mente que não discrimina, mas sim aceita aquilo que vem, da forma que vem.

terça-feira, 22 de janeiro de 2013

Me dê suas próprias palavras


" Sete, sabedoria. Desenvolvendo aprendizagem, aplicação e compreensão a realização é a sabedoria. Buda disse, “Praticantes, se vocês tiverem sabedoria vocês não se apegarão aos desejos, vocês devem examinar a si mesmos continuamente e não permitir nenhum descuido, pois este é o caminho da iluminação. Aqueles que não praticarem isso não serão monges nem leigos, não há como se referir à eles. A verdadeira sabedoria é como um barco seguro para atravessar o oceano da doença, velhice e morte, como uma tocha luminosa na escuridão da ignorância, como um bom remédio para todas as doenças, é como um machado afiado para cortar a árvore das ilusões. A sabedoria resultante do ouvir, refletir e praticar o dharma pode assim ser usada para aumentar o mérito no caminho. Se alguém chegar a possuir a luz da sabedoria poderá ver a verdade com seus próprios olhos”.

 Isso nós estamos fazendo agora, estamos ouvindo o Dharma. Estamos ouvindo o que Dogen escreveu em mil duzentos e cinqüenta e três, não estamos jogando fora essa sabedoria, estamos tentando aprende-la, mas é difícil obter a sabedoria, porque apenas ouvir é uma bela atividade, mas ela tem que ser transformada em prática, porque senão ficaremos como os mestres Zen normalmente dizem, “não fale das palavras de Buda”. Isso é o que os mestres Zen diziam para monges, quando esses retrucavam, “Ah, mas os sutras dizem isso!”, “não me diga as palavras de Buda, não gosto das palavras de Buda, me dê suas próprias palavras”. Não é que eles desprezassem as palavras de Buda, o que eles não gostavam era a mera repetição das palavras de Buda, porque isso não possui nenhum significado. Então, “não me fale das palavras de Buda, quero ouvir sua palavra, sua verdade, sua prática como é, o que você está vivendo?”, isso é que importa, o resto são só palavras, não é sabedoria.


Não devemos confundir este ensinamento com a crença de que a sabedoria dos outros é inútil, é sim sem sentido quando não acompanhada de prática, porém se mostra-se com ações ela é verdadeira, se assim não fosse os mestres não se esforçariam tanto para difundir o Dharma.

segunda-feira, 21 de janeiro de 2013

Uma mente estável


(continuação, Os oito aspectos da iluminação)

" Seis. Meditação. Meditação significa permanecer no dharma sem distração com uma mente imperturbável. Buda disse,”Praticantes, se vocês concentrarem a mente ela entrará em estado de estabilidade e assim vocês poderão compreender as características dos fenômenos surgindo e desaparecendo no mundo. Fazendo isso suas mentes permanecerão imperturbáveis, assim como aqueles que querem evitar inundações constroem uma barragem, assim também o praticante cultiva a meditação para evitar que a água da sabedoria se perca.”

 Então, a primeira tarefa de vocês como praticantes de meditação é conseguir uma mente estável, enquanto ela estiver turbulenta vocês ainda não deram o primeiro passo, nós precisamos esfriar essa mente usando a imobilidade de nosso corpo, a respiração profunda, a ausência de estímulos e a boca fechada. 

 Nenhum aspecto deste último ponto é tão importante quanto o de evitar causar cisão na Sangha, este é considerado o maior crime budista depois de matar o pai , a mãe, um Buda e derramar o sangue de um Buda ou bodisatva, causar cisão na comunidade através de conversas, críticas, acusações ou desmerecimento de pessoas, afastando seres do caminho.  Uma mente calma e estável nos afasta dos temores e julgamentos vãos que criam a cizânia.

sexta-feira, 18 de janeiro de 2013

Plena atenção e os desejos

                                                       O grande mestre Saikawa Roshi

" Cinco. Plena atenção. Conservar os ensinamentos sem esquecimento é chamado de plena atenção e também lembrança perseverante. Buda disse, ”Praticantes, se vocês procuram um bom mestre protetor, nada se compara a plena atenção. Aqueles que mantêm a plena atenção não são invadidos pelas aflições e permanecem livres de várias ilusões, portanto vocês deveriam se manter plenamente atentos, pois aqueles que perdem a plena atenção, perdem as virtudes e seus méritos. Se vocês mantiverem a plena atenção se manterão ilesos mesmo quando cercados pelos desejos. " Porque você verá o desejo surgindo, não há porque se culpar pelo surgimento de um desejo, não é pecaminoso, se o desejo surgir apenas o identifique e identifique sua causa. Essa é a raiz do meu sofrimento, eu sofro porque cultivo esses desejos, eles é que escravizam. Devo entender como eles surgem dentro de mim, porque esse é o meu carma, são as minhas marcas se manifestando, se manifestam em mim dessa forma, estou sendo prisioneiro disso. Para quebrar esse ciclo tenho que enxergá-lo, ver como surge e praticar, pelo simples fato de ser reconhecido ele perde forças.

Pergunta – Se a gente ficar totalmente ausente de desejos não correria riscos de viver sem rumo?

Monge Gensho – Aqui há um problema. Em sânscrito existem várias palavras para desejo. Tanha é o desejo do tipo apego, desejo teimoso que sempre volta. Em termos de alimentos. Tanha seria a força que faz com que a pessoa fique gorda, atacar a geladeira e comer um quilo de sorvete. A pessoa sabe que não pode fazer, mas continua fazendo. Esse desejo, esse apego, leva ao sofrimento. Outras formas de desejo tem palavras especificas em sânscrito. Por exemplo, ditti é o desejo de defender opiniões, dou minha opinião e quero que ela seja aceita. Quando a pessoa está em uma conversa e dá uma opinião, essa opinião é dela, e por ser dela, se alguém disser algo ao contrario inicia-se uma discussão ferrenha, onde qualquer artifício é válido para que sua opinião seja aceita. Então ditti é o desejo de ter, manifestar e defender opiniões. Isso aparece em todos os lugares, inclusive na sangha.

No sesshin (retiro) o que a gente faz? O professor está dando uma palestra, lendo um texto, nós ouvimos, mas não manifestamos opiniões, justamente para treinar o fim de ditti, o nosso apego e desejo por defender e manter opiniões próprias. Em vez de se procurar a verdade, se agarrar a primeira idéia que surge em nossa mente. Existe o desejo de realizar coisas boas alcançar realizações espirituais, desejo de felicidade. Só que o desejo de atingir a felicidade não é alcançado através da obtenção de bens, ficar rico ou coisas desse tipo. Obter a felicidade é obter uma mente correta que sabe usar as benesses do mundo. Não é necessário ver a riqueza ou o dinheiro como uma coisa errada, é um instrumento e pode ser usado. No budismo não existe a idéia de que, em si, apenas a pobreza leva a uma realização espiritual. Para isso temos o famoso sutra de Vilamakirti, que era no tempo de Buda, um poderoso comerciante. Ele era muito sábio e vencia todos os discípulos em discussões do Dharma.

Os discípulos de Buda tinham problemas com ele quando se tratava de discussões do Dharma, ele sempre dava respostas que os discípulos não conseguiam contradizer. No sutra de Vilamakirti, ele está doente e se pede aos discípulos visitá-lo. Cada discípulo, então, apresenta como motivo o fato de ter sido derrotado em discussões do dharma, para não visitá-lo. Até que aparece Manjushri. Nós temos no Zendo uma estatua de Manjushri, discípulo de Buda que é representado sentado em meditação em cima de um leão, segurando uma espada. A espada de Manjushri corta em um. Manjushri vai então ver Vilamakirti , (em outra ocasião Vilamakirti já havia dado uma resposta forte aos discípulos , ele estava voltando de uma visita à Buda e encontra com os discípulos que perguntam,”aonde vais?”, Vilamakirti responde, “Vou ao mosteiro”. E os discípulos dizem, “Como assim, o mosteiro fica na outra direção!” e Vilamakirti responde, “Vocês estão indo para o mosteiro de vocês, o meu mosteiro fica na cidade, é a cidade, onde existem pessoas que precisam de comida, empregos, habitação e pessoas que precisam de ajuda e é onde eu trabalho, lá é meu mosteiro”. Então Manjushri pergunta, “Você é um Bodhisathava, por que está doente?” e Vilamakirti responde, “Todo o mundo está doente, todos os seres, por isso eu estou doente”. Vilamakirti é o exemplo de Bodhisathava para os leigos. Aquele que trabalhando no mundo, adoece pelo mundo, trabalha todo o tempo para os outros, não trabalha para si. Ele é rico, mas a riqueza dele não é para ele, a sua riqueza é para ajudar todos os seres. O modelo do leigo.

quinta-feira, 17 de janeiro de 2013

Diligência



" Quarto, diligencia. Conservar virtudes sem interrupção é chamado diligência pura e genuína avançando sem olhar para trás. Buda disse; “Praticantes, se vocês forem diligentes em seus esforços nada será difícil, é como um pequeno fio de água que é capaz de perfurar uma rocha se continuamente cai sobre ela. Entretanto, se forem negligentes em sua prática e suas mentes constantemente desanimarem, isso será como friccionar paus para produzir fogo, mas parar antes que eles fiquem quentes. Pode algum bom resultado ser esperado disso? "

Isso é interessante, não é? Porque também os praticantes Zen, e isso é normal, iniciam a prática indo ao centro Zen e fazendo meditação com o grupo, mas não conseguem praticar em casa, não conseguem uma prática diligente mesmo caminhando, mesmo ao examinar a própria mente . Isso seria a prática diligente, não é uma prática ocasional, de quem de vez em quando vai ao Zendo. Esse tipo tem pouco resultado. Basta ver o que acontece em um sesshin, onde somos, em razão do grupo, obrigados a ficar sentados e agüentar uma prática de que sozinhos nós desistiríamos. O grupo ajuda muito, a Sangha dá uma força tremenda. Inclusive, professores, candidatos a monge, a mesma coisa, não se sentariam assim se não estivessem praticando junto com grupo. É necessário que a gente se comprometa com atividades do Dharma para ganhar força para nós mesmos. Senão é como se fosse uma pessoa que assumiu o compromisso de levar uma flor no Zendo toda semana, ela tem que ir, pois se não for ficará faltando a flor pois ninguém colocará no lugar dela. Esse compromisso é que faz com que surja a prática, a diligência. A sangha é importantíssima para proporcionar as oportunidades de uma prática maior e os efeitos de um sesshin (retiro) podem ser vistos. Fazer um treinamento em sesshin é muito mais do que se fizesse o mesmo numero de zazens uma vez por semana. Levaria dois meses para fazer o que a gente faz em um dia de sesshin. Como é acumulado e difícil, o efeito é muito maior.

quarta-feira, 16 de janeiro de 2013

Solidão



Aluno – Esse terceiro aspecto que diz respeito à solidão é na verdade uma coisa que pode ser aplicada nesse caso, porque a pessoa que está com a mente calma estará em solidão mesmo que esteja no meio de uma multidão. Acredito que a melhor solidão é a solidão da mente. A verdadeira solidão, a verdadeira renúncia está dentro do homem.

Monge Genshô - Boa observação, nós podemos observar também que dentro do sentido dessa prática, como deve ser a pratica do leigo? Já que ele não pode ficar sozinho realmente, pois vive no mundo, trabalhando, estudando etc., ele deve agitar o menos possível o mundo. Essa não é uma solidão triste, é uma solidão plena, o homem esta pleno de si mesmo. Está em contato com o absoluto. Exatamente por isso essas pessoas são procuradas para servir de apoio, pois os outros sentem que essas pessoas estão calmas, centradas, que são felizes. Outro aspecto é que temos que procurar como leigos, relacionamentos sólidos, estáveis, calmos, felizes. Essa relação deve transmitir às outras pessoas uma sensação de calma a ponto de as pessoas se sentirem a vontade em lhes fazer uma visita, pois é uma casa que transmite isso. Você deve procurar menos agitação e não mais. É esse o sentido da prática para o leigo. Também o mundo não poderia ser composto de monges senão terminaria em uma geração, é preciso que haja pessoas que vivam vidas comuns. Quando a gente fala com uma pessoa muito agitada, nós dizemos que ela tem que sentar por quarenta minutos de frente para a parede, quieto e imóvel. A primeira coisa que ela diz é que isso é impossível para ela, que não consegue e a ansiedade a fará subir pelas paredes. Porque essa é a imagem que ela tem da própria mente, é que é impossível se enfrentar, por isso, as pessoas querem se distrair, se divertir.

Aluno – Existem pessoas que chegam em casa e ligam a televisão para ter o que escutar, porque não conseguem estar sozinhas consigo mesmas.

Monge Genshô – Porque é difícil demais para elas. Nós temos que entender que isso é sofrimento, temos que nos compadecer disso e entender. As pessoas que são capazes de chegar num local e ficar em silêncio, estão muito melhor do que as que precisam uma música de fundo ou uma televisão ligada para não se sentirem abandonadas. Não sentirem medo, tédio ou algo do tipo.

terça-feira, 15 de janeiro de 2013

Apreciar a quietude



" Apreciar a quietude é o terceiro. Isso significa viver uma vida solitária separado de todas as perturbações mundanas." Essa era a recomendação dele para os monges. Como o postulante pretende ser monge, isso significa para ele toda uma opção. O mestre fica esperando que ele desista, então vai sempre adiando, “primeiro você acaba a faculdade, depois a gente conversa”, e espera uns quatro anos para ver se ele é realmente capaz de viver uma vida separada de todas as perturbações mundanas. Essa prática do sesshin é feita uma vez por mês, durante alguns dias, nos mosteiros Zen, nas outras semanas acontecem meditações pela manhã e a noite e o resto do dia é preenchido com trabalho. Dia sem trabalho não tem comida. O feriado é a semana de sesshin.

"Buda disse, “Praticantes, se vocês desejam desfrutar o silêncio e a felicidade do nirvana, vocês deveriam deixar o clamor para trás viver sem barulho em um local solitário. As pessoas que vivem nos lugares quietos são respeitadas pelos deuses, por isso vocês deveriam abandonar seu eu e aos outros e viverem sozinhos, dessa maneira eliminando a raiz do sofrimento. Aqueles que gostam de multidões são perturbados por elas e sofrerão seus aborrecimentos, da mesma forma que uma árvore seca quebra quando muitos pássaros pousam sobre seus galhos. Laços e apegos mundanos os afundam em um mar de dores, como um velho elefante atolado em um lamaçal. " Assim como no tópico anterior, treinamos a satisfação, no sesshin, recebendo coisa muito simples e tendo que nos satisfazer com elas, tendo que suportar o desconforto de muitas horas de meditação, também ficamos isolados dos outros, por isso nunca é demais insistir sobre o voto de silêncio. Sempre considere antes de falar: - É necessário? Precisava mesmo fazer esse comentário? Temos que treinar falar o necessário e aprender na vida a cortar a fala inútil, que é um dos maiores problemas.

A fala inútil é um dos maiores problemas do treinamento do praticante Zen. Vocês podem observar que o numero de atritos em um sesshin é imensamente menor com o voto de silêncio. Se no sesshin fosse liberado o voto se silêncio, certamente alguém diria algo que ofenderia outras pessoas, ou faria uma observação que desagradaria alguém, ou falaria demais e perturbaria, já é demais tudo que pensamos, quando falamos tudo se potencializa.

segunda-feira, 14 de janeiro de 2013

A Fama



Os professores budistas sempre tocam nessa questão de fama. Não é só agarrar coisas, ter coisas, mas o desejo de ser preeminente, de ser ouvido, de ser respeitado. “O mundo corre atrás de fama e honra, roupas bonitas e conforto. Mas você corre e permanece insatisfeito até a morte.” Como diz o poema de Kodo Sawaki, porque essas coisas são transitórias e mudam. Para os professores do dharma é um aprendizado quando você tem um discípulo que o adora, ele vem e lhe diz “você é maravilhoso, tudo que você diz é perfeito!” é preciso tomar muito cuidado, pois é exatamente essa pessoa que quando pensar que você cometeu um erro ou quando ela imaginar que que você não lhe deu a atenção devida a suas opiniões de como deve ser conduzida a comunidade, irá transformar toda a admiração em desprezo, em ódio, em palavras ruins.

É muito interessante observar, que assim como os objetos, a fama, a honra e a admiração, são coisas que sobem e descem. Deve ser muito duro para as pessoas que tornam-se repentinamente muito famosas, muito poderosas, ganhando títulos, saindo na imprensa, ganham campeonatos de repente começar a perder sua fama, as mesmas pessoas que corriam atrás desaparecem. Ouvi uma declaração do Maradona que achei muito interessante. Ele estava internado numa clinica de tratamento de pessoas drogadas, perturbadas. Ele que havia sido um dos maiores jogadores de futebol de todos os tempos. Ele disse que era muito perturbador, porque na clinica onde ele estava tinha muita gente louca, um se dizia Napoleão, outra se dizia Cleópatra, e ele dizia que era Maradona e ninguém acreditava!

"Portanto vocês deveriam se livrar rapidamente da cobiça, tanto por esse motivo, quanto pelo motivo de que essa liberdade dará origem a varias virtudes. Alem disso, as pessoas com poucos desejos estão livres da lisonja e da extraviação e também não são escravizados pelos seus próprios sentidos. Satisfeitos com pouco eles não possuem preocupações e medos, estando assim sempre calmos. Aqueles que têm poucos desejos têm o nirvana. Segundo; satisfação, satisfação significa estar contente com o que quer que se tenha. Buda disse: “Praticantes, se vocês desejam de libertar do sofrimento, deveriam observar a satisfação. Estar satisfeito é ter um estado mental pacifico e feliz. Uma pessoa satisfeita é feliz mesmo tendo que dormir no chão, enquanto que o insatisfeito é infeliz mesmo vivendo em um palácio. A primeira é rica mesmo que seja pobre, a segunda é pobre ainda que seja rica. A pessoa satisfeita sente compaixão pela insatisfeita pois esta é continuamente levada pelos cinco desejos. "

domingo, 13 de janeiro de 2013

Palestra em Maringá - PR



Palestra e Zazen com o Monge Genshō

Data: 15/01/2013

Horário : 20:00

Local: Rua Joubert de Carvalho, 623. Sala 607.

Maringá-Pr

Contribuição voluntária sugerida: R$ 20,00
Organização: Comunidade Zen de Maringá (zenmaringa.blogspot.com.br)
Inscrições: lvargas@onda.com.br

sexta-feira, 11 de janeiro de 2013

OS OITO ASPECTOS DA ILUMINAÇÃO

( Palestra em sesshin (retiro zen))

Ainda que estejamos em um sesshin muito curto, de apenas dois dias, no segundo dia a maior parte daquela tralha mental, que se apresentou muitas vezes em nossa mente no primeiro dia, começa a desaparecer e a partir do segundo dia  começa a mudar a percepção das coisas. Muda a maneira de ver, a energia das pessoas na sala muda, a medida que ficamos cansados e com dor, nosso orgulho e vaidade tendem a enfraquecer junto com o corpo.

Então o cansaço e a dor são benéficos para a mente. A oportunidade surge quando a mente pára e o ego desiste. É a oportunidade da mente ver um mundo mais lindo. Espero que a caminhada de hoje pela manhã tenha mostrado à vocês um mundo sutilmente diferente do mundo de ontem e de antes de ontem. São diferenças internas que vocês poderão perceber.

Vamos estudar um texto que é Os Oito aspectos da iluminação, escrito por Dogen Zenji em Eihei Ji no dia seis de janeiro de mil duzentos e cinqüenta e três. Nesse momento, Dogen esta comentando o ultimo ensinamento de Buda. “Depois de passar quarenta anos ensinando, Buda está morrendo e dá esse ultimo ensinamento para seus monges.” Nós como leigos devemos entender que ele está falando para monges,  como leigos não estamos abrindo mão de tudo como ele preconiza para os monges. "Os vários budas foram todos pessoas iluminadas. A sua iluminação possui oito aspectos importantes e a realização desses oito aspectos é a base do nirvana." Nirvana não é um lugar, não é um céu ou paraíso, o nirvana é aqui nesse lugar onde nós estamos. Aqui é samsara se nós temos olhos que vêem samsara, aqui é nirvana se temos olhos que vêem nirvana, o nirvana e o samsara estão no mesmo lugar. Samsara é o mundo da perambulação, um mundo onde nós andamos procurando a felicidade sem parar. Procurando um emprego melhor, um mundo cheio de “ses”, se eu tivesse um carro novo, se eu tivesse uma casa boa, se eu morasse num país sem pobreza, se eu tivesse um grande amor, se, se, se. Então esse mundo de “ses” onde as pessoas ficam procurando a felicidade sem parar é o samsara. 

 O nirvana é o mundo dos não impulsos, não desejos, não pensamentos, NIR, significa não e VANA pode ser entendido como ventos, no sentido de vento das emoções, paixões e impulsos. Literalmente o significado é fogo extinto.  Então é um mundo onde há paz e não somos empurrados de lugar para lugar pelos ventos dos desejos. No sesshin pode-se notar bem o samsara, se minha almofada fosse mais macia, se minhas costas não doessem, se meus joelhos agüentassem, se o cara que controla o tempo desse uma olhadinha para o relógio e percebesse que já deu quarenta minutos. Como pensamos todas essas coisas o nirvana não existe nesse momento.

Nós não ouvimos a serra do lado de fora como um ensinamento de Buda. No fundo, o vento nas arvores, o chacoalhar das folhas, o zumbido do mosquito são vozes de Buda, mas não entendemos. Por isso é samsara.  "Este foi o ensinamento final de nosso professor original, Buda Shakyamuni, dado na noite de sua morte. Primeiro; ter poucos desejos. Ter poucos desejos significa não buscar extensivamente os objetos de desejos. Buda disse: “Praticantes, vocês deveriam saber que aqueles que querem muitas coisas, buscam tanto a fama quanto o ganho, e assim as suas aflições são muitas. Aqueles com poucos desejos, entretanto, nada procuram, não tem anseios e assim não sofrem”.

quinta-feira, 10 de janeiro de 2013

Não reverenciamos a pessoa mas a linhagem




Pergunta – Eu só fiz essa prática quando fui num sesshin em Porto Alegre, foi um dia. Mas pelo que entendi a prostração não é para a imagem do altar, é você se reconhecer como...É isso?

Monge Genshô –  Também é isso. A estátua de Buda simboliza uma determinada coisa. A prostração é para o que ela representa, mas você também tem a natureza de Buda. Até que você reconheça que todo o universo se inclina com você. Mas você precisa praticar primeiro, porque isso é conversa, falar sobre isto não é nada. Então você precisa fazer prostrações para o altar, depois reverênciass para os colegas, e quando o professor sai da sala, todos devem fazer, devem prestar reverência inclinado a cabeça. Isso é importante, senão não criamos o relacionamento com o professor.
E o professor representa uma linhagem, então reverenciamos uma linhagem de 2600 anos, vai até Buda. Essa sequencia de Buda até os dias atuais é importantíssima, porque não se perdeu, uma pessoa foi passando para outra e não se deixou cair, esse vidro não se quebrou. Muitos e muitos mestres deixaram sucessores, muitas escolas morreram nesse meio tempo, algumas não sobreviveram, nós temos a felicidade de conhecer uma escola sobrevivente. Porque de Hui Neng saíram cinco grandes escolas, só sobram duas. Todos os mestres das outras escolas, das outras linhas foram morrendo. Não resta uma única linha feminina, todas desapareceram no século XIII com a invasão muçulmana na Índia. Só sobraram linhagens masculinas de algumas escolas. Então quando uma pessoa que representa uma linhagem como essa passa, se não nos inclinamos nós não entendemos o sentido dos mantos de Buda, não reverenciamos a pessoa mas a linhagem.

Aluno –Eu penso que...

Monge Genshô – Você precisa pensar menos. Agora, meu conselho para você, pense menos, só pratique, pense menos.

Fim  (Palestra em Cuiabá decupada da gravação por Chudô San)

quarta-feira, 9 de janeiro de 2013

Você precisa do que lhe parece difícil


(instruções em palestra para um grupo iniciante)

Monge Genshô – Havendo novatos ou antigos, sentamos quarenta minutos. Se alguém tem dificuldades físicas, pode sentar numa cadeira, não há problema, desde que sente numa cadeira com as costas eretas, sem se encostar. Se não suportar isso, não irá praticar depois, na realidade minha experiência é ao contrário, não facilite. Torne a prática realmente forte e isso vai ser o melhor. Quando fazemos sesshin as pessoas acordam as quatro da manhã e sentam seis e meia até oito horas por dia, claro, todos sofrem. Mas estou junto e sento com eles, todas as horas. Com o tempo a gente não sofre mais.

Se é para optar, em vez de ler, sentar. Porque ler todos podem ler em casa e a prática junta da meditação é mais eficiente porque é mais difícil levantar. Tem que haver um certo ardor em relação a prática mais severa. Eu recomendo que vocês tenham um altar, um Buda, incenso, flores. Mesmo que montem o altar para o zendô. Pode ser uma sala como essa, coloca-se os zabutons frente à parede, coloca o altar, delimita o local e quando entrar aqui é o zendô, cumprimenta-se, faz-se  gassho e sentem de frente para a parede quarenta minutos. Depois pode-se ler um texto e não discutir. Depois de tudo recolhido, fora da sala se quiserem conversar tudo bem. Mas no zendô não. Isso começa a criar um espaço especial. Não vou dizer sagrado porque no Zen tudo é sagrado e nada é sagrado. Mas há que criar a energia da prática. Se puder separar uma sala especialmente para prática, melhor, mas não é essencial, ela pode ser montada na hora. O que não pode é ser lugar aberto, por exemplo, o zendo num lugar onde outras atividades ocorram, pois as pessoas que entrarem não irão cumprimentar.

Observação - É que até agora a gente meio que resistiu a isso.

Monge Genshô - É que existe certa resistência às formalidades e rituais, sei disso, eu também tinha. Quem tem muita resistência em fazer prostração vem e fala, outro dia um médico veio e disse – Eu tenho muita resistência com isso, me ajoelhar, encostar a testa no chão em frente ao altar, em frente à Buda – então eu disse que também tinha no passado, mas é um grande remédio para o ego, para o orgulho e se você sente isso é porque tem um grande orgulho. Então aquilo que você sente mais dificuldade de fazer é aquilo que você mais precisa.

terça-feira, 8 de janeiro de 2013

A prática individual e a coletiva se completam




Observação de aluno - A gente começa a entender o mundo diferente também quando começa a querer ler os textos e tentar entender o Zen e essas coisa do não eu. Quando lemos em conjunto para tentar entender, tem uma hora que de tanto tentar entender intelectualmente a coisa passa a não ser mais viável (...) acho que tem que ser mais natural, se a gente fica muito intelectualizando, tentando discutir teorias, nos perdemos.

Monge Genshô – Nós devemos ler, mas discutir não vai ajudar. Mesmo na Sangha (comunidade) quanto menos as pessoas tentam impor uma opinião melhor. Eu penso isso ou eu penso aquilo, isso não é muito útil. Por isso no sesshin uma prática muito importante é o silêncio, não falar.

Observação de outro aluno - Posso falar pela experiência de um grupo de prática em Florianópolis, sem professor. Tínhamos um grupo e um professor, só que ele não morava em Florianópolis. E o grupo começou com as pessoas tentando sozinhas(...)basicamente o grupo se reunia para o zazen. E tentamos fazer disso o ato mais recorrente possível, nós tínhamos três reuniões semanais com o grupo, e nós tínhamos muitos praticantes, no zen quatro praticantes já é demais, chegamos a ter um grupo de dezoito e todos tinham um comprometimento muito forte pela prática, a prática diária de uma pessoa parece que não tem muita força, parece que quando se senta sozinho falta alguma coisa , mas se o grupo se reúne constantemente ele se fortalece. Nós sentávamos quarenta minutos, líamos um texto e tomávamos chá, essa era a prática. E tentávamos a cada três meses trazer o Monge Genshô para fazer um retiro, fora isso começamos a criar atividades, fazíamos zazenkai (...)mas se vocês se reunirem e chamarem professores do Dharma com certeza eles virão até vocês, mesmo estando longe. A prática é uma coisa muito forte, a prática individual e a coletiva se completam.

segunda-feira, 7 de janeiro de 2013

Não acalente um objetivo



Pergunta - Mas ao sentar para meditar, a gente senta sem um objetivo de responder à essas perguntas, a própria pratica  vai trazer essas respostas,. Eu não pratico tanto quanto deveria, e percebo que a gente senta e permanece a mesma coisa, os pensamentos vem e passam, alguns momentos parece que não pensa nada daí vem aquela coisa – Óh, consegui não pensar em nada – e aí pronto, já voltou tudo, mas é isso mesmo, é isso que vai acontecendo? O que eu percebi com o tempo, é que antes eu sentava e ficava agitada, louca que terminasse logo, agora eu sento e sinto já até um certo prazer, um pensamento de que é bom. Eu sinto que o grupo é muito importante, em casa parece que é uma mentira as vezes...É isso mesmo, é assim mesmo?

Monge Genshô – Está certo. Porem eu diria que sentar tentando não pensar em nada é tentar alcançar algo não real, afinal estar consciente do momento presente é uma forma de pensamento, porem sem elaborações. De modo que o praticante do Zen em seus estágios iniciais  deve sentar apenas tentando não seguir os pensamentos, deixar que os pensamentos passem, e há momentos em que tudo ficou tranqüilo simplesmente porque ficou tranqüilo, mas para não festejar isso é necessário não ter esse objetivo. Então como apontei no inicio, o erro aí é o objetivo. Por isso essa técnica de sentar no Soto Zen é chamada da Shikantaza – apenas sentar – não acalente um objetivo, não tente alcançar nada, isso é bastante importante. Se você medita, insights surgem. Mas esses entendimentos, também não podem ser o objetivo, eles surgem naturalmente, coisas que nós não entendíamos e passamos a entender. 

Quando a gente vê os praticantes é fácil perceber como são os alunos, é fácil entender o que está acontecendo com o treinamento deles pela maneira como eles perguntam. Primeiro querem manifestar opiniões, depois fazem perguntas mais difíceis, depois não fazem mais perguntas, quando deixam de fazer perguntas a gente sabe que o aluno passou um determinado ponto. É como se as questões tivessem se dissolvido. Quando ele chega na frente do professor, mesmo que ele pense – Acho que vou perguntar isso –  ele pensa – Não, não é preciso – ele sente que não tem sentido fazer a pergunta, então essa já é uma outra fase. Mas é lógico que isso não pode ser fingido, então quem sente necessidade de fazer perguntas, faz perguntas, e o professor responde. É necessário esse contato, mas sem a prática não acontece nada. 

 É necessário ter esforço, mas esforçar-se também não leva a nada. Se a gente pratica começa a entender, se eu me esforço não funciona, se eu não me esforçar não vou a lugar nenhum. Quando a gente começa a sentir prazer em ficar sentado já foi um grande progresso. Porque o pior estado é o daquela pessoa que não consegue parar, um estado muito agitado, muito turbulento. Na realidade  um mundo infernal.

domingo, 6 de janeiro de 2013

Teu momento


Ivo Santos Cardoso
Teu momento

Se tua alma e teu corpo foram tocados pelo amor,
revela todos os sorrisos que a vida transformou em lágrimas;
fala todas as palavras que te emudeceram na garganta;
abre aquelas portas do coração trancadas por secretos medos e vagas incertezas.
Liberta de ansiedade, vive este momento suave de entrega e aceitação,
de perdão e liberdade, de alegria e gratidão.

Tu que observas a vida com as lentes do infinito e da renovação eterna;
que valorizas no próximo as conquistas do espírito
prisioneiro do corpo corrompido e disforme,
eterniza este momento em tua memória.
Toma posse desta felicidade tantas vezes adiada como suave esperança.

Este momento é teu.

sexta-feira, 4 de janeiro de 2013

O mestre é um guia



Pergunta – O mestre pode ser um amigo?
Monge Genshô – Não, o mestre não pode ser um mero amigo. O mestre é alguém que tem uma realização espiritual e pode apontar o caminho para você. Um caminho que ele testou e experimentou. Talvez ele tenha feito um pedaço do caminho e possa ajudar você neste pedaço do caminho. Você tem que encontrar um mestre e aceitar sem discutir, porque seu julgamento não pode ser melhor que o dele. Encontrar um mestre é entrega, você não discute com o mestre, se você não concorda ele não é seu mestre, vá embora. Procure um em quem você confia e então não discuta.
Mas é necessário para o praticante fazer sesshin, viajar, ir para onde for possível, fazer retiros, praticar sozinho, conscientemente, aprender com o corpo, não dá para dizer o que ele tem que aprender. No meu relacionamento com um de meus professores não me lembro de ele dizer, “pratique assim, dessa ou de outra forma”, nada. Só sentar do meu lado e ficar ali praticando. Nenhuma instrução especial. E também não sinto que deva pedir nenhuma instrução especial.
 
Pergunta – (...) a gente fica em dúvida de como agir, se agir, como não agir (...)poderia ter feito de outra forma (...) aquela responsabilidade de agir naquele momento(...)queria saber como lidar com isso?

Monge Genshô – Quando você senta você cria uma mente capaz de se perguntar – Minha ação gera ou não gera sofrimento? – esse é o melhor caminho, olhar nossos atos e o que acontece e nos perguntarmos – Nossa ação gera sofrimento? – Como agir para diminuir o sofrimento no mundo? – E depois dessas perguntas feitas, quase todas as perguntas céticas estarão respondidas. Mas não espere ser perfeito, frequentemente me pergunto porque sou incapaz de agir sem aversão ou apego, nós somos seres cheios de dificuldades.

quarta-feira, 2 de janeiro de 2013

Falecimento Yndra


Yndra Janine Kerpen de Moraes, liderança zen budista em P. Alegre na Sangha Mente de Iniciante, faleceu hoje no início da noite de câncer, no Hospital Fêmina depois de longa luta. Até o final enquanto pôde falava no Dharma comigo diariamente e se preparava conscientemente para esta passagem. Para seus dois filhos e numerosos amigos e admiradores, entre os quais ardentemente me incluo, fará imensa falta.

Buddha não disse "a vida é sofrimento"



Não é verdade que Buda disse que a vida é sofrimento, este é um problema de tradução, ele disse que a vida é dukkha. E dukkha, em páli e sânscrito, os idiomas em que os sutras mais antigos estão escritos,  quer dizer cíclico, a raiz duk vem de eixo,  e como um eixo descentrado, que faz uma roda subir e descer, a vida é insatisfatória, as vezes é maravilhosa, feliz, outras vezes não é, porque nada é permanente, nada é feito para durar. 
Pode ser a melhor coisa, como quando você olha algo desagradável, não vai durar, para sempre não vai, tudo acaba um dia. A solução é uma libertação e essa libertação é o caminho que o Zen ensina. Mas não se obtém libertação sem guia, só praticando sem mestre a gente não consegue, é necessário um mestre para chutar a gente de vez em quando, para nos tirar dos enganos. Podemos estar praticando meditação durante muito tempo e estar enganados, perdidos em sensações agradáveis, ou mesmo mergulhados em redemoinhos de pensamentos recorrentes.