sexta-feira, 16 de agosto de 2013

As coisas como elas são



Venerável Dhammadipa continua: Os sutras de Bodhidharma ensinam que há quatro tipos de Samadhi (concentração meditativa) - o primeiro seria o Samadhi do “não saber”. Esse tipo de Samadhi eu aprendi na Birmânia e no Sri Lanka e são muito enfatizados na Escola Theravada e na Yogacara. A Escola Yogacara se baseia no estudo do Samadhi dessa mesma forma. O segundo Samadhi seria o da “busca das coisas como elas são” e esse é o Samadhi que vocês estão praticando agora. Quando você realiza as coisas como elas realmente são você se torna nobre, ou seja, quando pode realmente compreender o objeto da liberação. Nos primórdios do Budismo, quando você realmente realizava o objeto da liberação, não podia continuar no Samsara (mundo da perambulação) por muito tempo. Como vocês sabem, a Escola Mahayana enfatiza a unidade do Samsara e do Nirvana. As escrituras do Mahayana ensinam que tanto o Samsara quanto o Nirvana não têm natureza própria, portanto não podem ser diferenciados. Por isso não é de costume usar o termo “Nirvana” mas sim “as coisas como elas são”. Nas “coisas como elas são”, de fato, bem e mal não têm qualquer diferença, ambos são como eles são. Esses são os meios hábeis para a prática do Bodhisattva e, sem entender isso, vocês não poderão entender a prática do Bodhisattva. Isso é também a base da experiência Zen - as coisas são como são e nesse âmbito todos os fenômenos são iguais.

Porque nesse âmbito todos os fenômenos são iguais? A Escola Yogacara enfatiza que a mente é esse âmbito de “as coisas como elas são”. A principal prática de meditação na Escola Yogacara é quanto à natureza da mente e ela não tem diferenciação, por isso que a mente tem a capacidade de captar todos os objetos, pois, se ela tivesse diferenciação, como poderia ser capaz de captar todos os objetos? A mente é para ser contemplada como o próprio espaço e, tal como o espaço tem lugar para tudo, com a natureza da mente é a mesma coisa. A transformação da mente é que será capaz de ver sujeito e objeto. Isso é muito importante de ser compreendido. A transformação ocorre de fato na mente em si e em nenhum outro lugar.

A mente no Yogacara pode ser compreendida em três aspectos: o primeiro é o sinal do objeto, por exemplo, supondo que alguém esteja lá fora, para que ele seja real, eu preciso de uma referência e, a partir dessa referência, eu passo a entender esse objeto como real. Nos apegarmos a essas referências dos objetos, é estar de fato no Samsara, é através desse apego que continuamos no Samsara. Isso implica de fato na base e na transformação da consciência em si. Quando experenciamos um objeto como real, temos essas referências de “sinal do objeto” e temos, então, o aspecto subjetivo da mente que entende essa realidade como essas referências do objeto. Após isso temos o aspecto do testemunho, esse aspecto do testemunho é denominado Alayavijnana (consciência depósito universal), que é onde se encontram todas as consciências. Esse conceito não é estranho à filosofia ocidental, Sócrates já dizia que para entender alguma coisa você precisa de suas experiências pregressas, ou seja, de suas lembranças.

Comentário de Genshô Sensei: a idéia de Alayavijnana é a de que não somente minhas lembranças ou consciência estão contidas nesse depósito, mas todas as experiências do universo inteiro, todo conhecimento, tudo que acontece no universo está contido em Alayavijnana, a questão é se posso ou não acessar esse depósito.
(continua)