quarta-feira, 11 de dezembro de 2013

Estudando o Shushogi


Vamos começar hoje a estudar o texto “Shushogi”. O texto inicia com uma explicação do significado da prática e da iluminação. A palavra “iluminação” não expressa muito bem o que Buda queria dizer, é uma palavra muito ocidental e dá a impressão de ser algo extraordinário. A palavra que Buda usou é mais corretamente traduzida por “despertar”, “estar acordado”. Mas despertar do quê? Despertar do sonho, ver as coisas com clareza, tais como elas realmente são e não como imaginamos que sejam. Toda a experiência é distorcida pelo conteúdo de nossa mente, o que vemos, ouvimos e sentimos é interpretado de acordo com conceitos, pré-conceitos e idéias, coisas que já estão flutuando em nossa mente. Essa é uma das razões que fazem com que o budismo seja muito difícil de ser entendido.

É comum durante uma conversa sobre o budismo as pessoas perguntarem em quê o budista acredita.

O budismo não é a religião do acreditar, não se baseia em fé ou crenças, antes se dedica a destruir aquilo à que as pessoas se agarram. O budismo não ensina a acreditar nem em Buda, que era um homem como nós e, portanto, não deve ser adorado como uma divindade. O budismo tem várias histórias sobre a humanidade de Buda e seus discípulos. Uma vez uma senhora vinha pela floresta e se deparou com Shariputra acocorado fazendo suas necessidades. Conta-se que ela ficou abismada com a dignidade e beleza de seu ato. A simples visão de Shariputra cumprindo algo que é normal a todos os seres humanos, mas de que nos envergonhamos, impressionou a senhora a tal ponto que ela tornou-se discípula de Buda. Quando ouvimos pela primeira vez essas histórias budistas, elas nos parecem ultrajantes, mas isso é proposital. O texto que vamos estudar começa assim:

Texto
“O completo esclarecimento do significado do nascimento e morte - eis a mais importante de todas as questões para os budistas. Se há Buda dentro do nascer/morrer, não há nascer/morrer.

Simplesmente compreenda que nascimento e morte são em si mesmo o Nirvana, não existindo nascimento e morte a serem odiados, nem Nirvana a ser desejado. Então, pela primeira vez, você estará livre de nascimento e morte. Tomar consciência deste problema é de importância suprema”.


Comentários:
Já neste primeiro parágrafo alguns conceitos são destruídos. Nascimento e morte são o mesmo Nirvana. Mas o que é o Nirvana? Nirvana não é um lugar. É um estado, uma maneira de ver paixões, sem os ventos das paixões. Literalmente a palavra significa “fogo extinto”, no nosso contexto seria sem ventos, sem os ventos das paixões, sem movimento. Nirvana é o estado em que a pessoa não é movida pelas paixões, amor, ódio, raiva, ciúme, apego, posse, medo.

As pessoas normais vivem no mundo como folhas levadas pelo vento num corredor, seguem batendo de um lado para o outro. Nirvana é a perfeita calma. A folha cai, se transforma em húmus, vira planta novamente, novamente folha e mais uma vez cai, neste ciclo não há nascimento e morte.  Existe somente o ciclo ou o fluxo e se você é calmo e o vê desta forma, ele é Nirvana.

Quando dizemos “atingir o Nirvana”, significa atingir a paz proveniente da compreensão do ciclo, sem enxergar fins e começos. É como olhar para um círculo - onde está o começo e o fim do circulo? Só quem vê inícios e fins somos nós, então nascimento e morte são em si mesmo, Nirvana.

Não existindo nascimento e morte para ser rejeitado, também não há Nirvana a ser desejado. Ao olharmos este “sem início nem fim” e atingirmos a paz, Nirvana é apenas o oposto do movimento de nascimento e morte. O primeiro passo para livrar-se do sofrimento é a compreensão correta. Somos nós que dividimos o mundo entre Samsara e Nirvana. Esse é o mundo do Samsara onde perambulamos tocados pelas paixões e vemos como oposto, o mundo do Nirvana, mas na realidade o mundo do Samsara é o mundo do Nirvana. A diferença está no nosso olhar. Onde uma pessoa vê dor e sofrimento, nascimento e morte, a outra vê fluxo sem fim.